Chegou o momento da última parte dessa série e vamos falar um pouco sobre algumas obras de arte pertencentes ao movimento artístico do século 19 e associá-los a alguns personagens do mundo de ACOTAR. Lembrando que as obras mostradas aqui possuem inúmeras interpretações, portanto uma única interpretação não deve ser levada como verdade absoluta.
Atenção: Esse post pode conter gatilhos de depressão e suicídio.
- Ofélia – Sir John Everett Millais:
John Millais foi um dos fundadores da irmandade Pré-Rafaelita, a mesma de Jonham Fussli. A obra Ofélia, no entanto, se encaixa bem nos padrões do romantismo gótico ou sombrio. O quadro faz alusão a uma morte por acidente ou suicídio – não se sabe ao certo qual dos dois-, e por diversos anos, ganhou variadas reproduções no cinema, fotografia e pinturas, sendo extremamente famoso até hoje.
A obra, ao longo dos anos ganhou diversas interpretações relacionadas ao suicídio de Ofélia, opiniões que iam desde especialistas da psiquiatria, a ativistas do movimento feminino. Há diversas discussões sobre “a loucura que levou a morte” em Ofélia e muitas delas relacionam-se a cultura da época em que foi discutida. Os principais que devem ser considerados nesse post é a discussão sobre a famosa “histeria” feminina da época vitoriana em que qualquer comportamento fora do padrão de submissão era associado à loucura da mulher, que sempre é retratada como errática, com extremo desejo sexual e desobediente.
Porém, é importante analisar a obra de Shakespeare, Hamlet, para entendermos melhor a personagem Ofélia. Em algumas interpretações, Ofélia enlouquece e consequentemente morre por achar que seu amado (Hamlet) também enlouqueceu em razão de amá-la, quando na verdade Hamlet só estava fingindo ter enlouquecido por vingança. Em outras visões, esse suposto suicídio de Ofélia acontece após ela ver seu pai sendo morto por Hamlet.
Somando-se a isso o elemento da água, por ela estar em um rio, é interessante notarmos como a água está sempre presente na visão da morte por suicídio. Principalmente em banheiras. Constantemente na arte, cinema, entre outros o elemento da banheira com água se faz muito presente, por trazer aquela sensação do frio, úmido.
Em Corte de Chamas Prateadas, temos Nestha Archeron lidando com sua depressão. A relação que podemos fazer entre o quadro Ofélia e Nestha são muito grandes, pois Nestha viu seu pai morrer na sua frente e o trauma que o Caldeirão lhe deixou de banheiras e coisas similares, além é claro, da relação que podemos fazer com seu comportamento, em que Nestha se vê muito como um animal, fora de controle, indomável quase – o que faz relação com a “histeria feminina” discutida em Ofélia.
Trechos de Corte de Chamas Prateadas, páginas 19, 474:
“A torneira rangeu, o metal era gelado ao toque, e água escorreu, então jorrou na banheira rachada e manchada. […]
Foram meses lutando contra aquilo. – O pânico que lhe tensionava o corpo e fazia com que seus ossos tremessem quando eram submersos. Mas ela havia se obrigado a enfrentar. Aprendera a se sentar na água gélida, enjoada e trêmula, com os dentes trincados; recusara-se a se mover até que seu corpo reconhecesse que estava em uma banheira e não no Caldeirão.”
“Nestha tinha nascido errada. Tinha nascido com garras e presas e jamais conseguira evitar usá-las, jamais conseguira sufocar aquela parte que rugia diante da traição, que podia odiar e amar mais violentamente do que qualquer um jamais entendera.
Ela não era melhor do que um cão raivoso. Tinha agido como um cão raivoso com Amren e Feyre. Uma besta […]
Será que ela valia… será que era digna de valor? Foi essa pergunta que fez tudo desabar dentro dela.”